O FUNGO DE UNHA
(Matéria publicada na Revista Brasil Ornitológico nº 33)
Muitos criadores de canários já tiveram a desilusão de ver um potencial campeão, aquele canário que se destacava na cor, de repente imprestável. Muitos juízes já tiveram o desprazer de desclassificar belos pássaros pela mesma razão. Já julguei exposições de canários onde mais de 10% dos pássaros foram desclassificados por serem portadores de micose em dedos. Já vi fungos de unhas em pássaros de quase todo o Brasil mas não nas proporções que ocorrem em Santa Catarina. O fato deve estar relacionado às condições climáticas, principalmente à umidade relativa do ar. Uma consistente observação a favor desta hipótese é que a doença é mais comum nas cidades próximas de rios e do mar. É mais freqüente no fim do verão e no outono, mas nesta época, a superpopulação nos criadouros é grande. É provável que a doença seja transmissível, pois é comum vários pássaros de um mesmo gaiolão estarem contaminados.
Manifestações Clínicas
A doença é de difícil reconhecimento nas suas fases iniciais porque o pássaro afetado só levanta a pata doente nas fases adiantadas, quando a unha geralmente está irremediavelmente perdida. O início, por vezes, é caracterizado por lesões brancas ou amarelas ou engrossa-mento da ponta do dedo comprometido, fatos comuns a outras doenças das patas de canários. Geralmente o que caracteriza o quadro é a presença de uma lesão que se inicia dentro da matriz da unha e, em poucos dias, recobre toda a unha. Neste estágio a unha já está morta e não observa-se o filete sangüíneo que a nutre. A lesão não se destaca em alguns casos, pode haver contaminação secundária resultando em septicemia e morte do pássaro. As fotos mostram a doença em seus estágios avançados.
Diagnóstico Laboratorial
O diagnóstico de laboratório é difícil, pelo alto custo dos exames e por não dispormos em nosso meio de laboratórios com prática em micologia ornitológica. Por analogia com o que praticamos no diagnóstico etiológico das onicomicoses humanas, enviamos para exames micológicos, microscopia e cultura, raspado de unhas de canários doentes. Todas as amostras tiveram resultado negativo, isto é, os fungos não eram encontrados na superfície das lesões. Decidimos, então, enviar para exame histológico de dedos amputados. Como os resultados foram interessantes, serviram de motivação para que, embora reconhecendo nossas limitações, escrevêssemos este artigo. O estudo das lâminas coradas pela técnica de hematoxilinaeosina e pela técnica de Grocott (pesquisa de fungos através de impregnação pela prata), mostrou processo inflamatório crônico com edema, extasia e congestão de vasos sanguíneos e a presença de formas fúngicas em hifas curtas e blastosporos, sugestivas de Tinea verrucosum que acomete seres humanos provocando lesões verrugosas. Outra característica marcante é a ausência do filete vasculo-nervoso que nutre a unha. Caso o problema persista em nosso criadouro, vamos tentar a cultura do fungo na matriz do dedo amputado onde se encontra o principal foco.
Tratamento
Quando percebemos a lesão verrucosa recobrindo a unha, geralmente não há tratamento eficaz que recupere o dedo. Os cremes e pomadas a base de imidazólicos são pouco eficientes, pois nao alcançam os fungos que estão localizados na matriz da unha. Os que alcançam melhores resultados são a base de oxiconazol (oceral) e bifonazol (mycospor). Os esmaltes para uso humano, com alta concentração do princípio ativo, como o tralem para unhas e o loceryl, pelas mesmas razões, também apresentam eficácia reduzida. O tratamento local que apresenta melhores resultados, embora cause espanto, é a imersão da pata afetada em ácido sulfúrico a 50% por 20 a 30 segundos, seguidos de lavagem em água corrente. Este procedimento é inócuo, não restitua o aspecto normal da unha, mas impede sua evolução. Nas onicomicoses humanas, várias drogas usadas por via oral são eficazes no tratamento da doença como os imidazólicos (cetoconazol, fluconazol e itraconazol), a griseofulvina e a terbinafina quando usados por meses. Nos canários, como não conhecemos o metabolismo destes medicamentos (absorção, níveis sanguíneos, metabolização, concentração em tecidos queratinizados como pele e unhas e vias de excreção), torna-se difícil determinar corretamente as dosagens e o tempo de uso. Já experimentamos usar em nossos canários e cetoconazol (cetonax, nizoral, etc.) n dose de 1 gr., 5 comprimidos triturados, e o itraconazol (sporanox, itranax) 4 cápsulas de 100 mg por kg de farinhada seca, por pelo menos 3 meses. Os resultados curativos forma muito pobres, mas algumas unhas onde a doença estava nos estágios iniciais recuperaram o aspecto normal. É importante ressaltar, que a incidência de novos casos no plantel diminuiu bastante, tendo o medicamento agido preventivamente.
Profilaxia
Algumas medidas simples, embora trabalhosas, são eficientes na prevenção de casos novos. Todas são do conhecimento dos criadores, mas muitas vezes, negligenciadas.
a) Criadouro seco, arejado, limpo, ensolarado e sem superpopulação. Lembramos que o número máximo de canários por metro cúbico de volume do criadouro é cinco.
b) Plantel sadio. Todas as aves que apresentarem o problema devem ser submetidas a isolamento e tratamento, ou amputação da parte afetada. Recomendamos a desinfecção do dedo com iodo e a amputação com bisturi ou faca aquecidos até ficarem vermelhos e nova desinfecção. O calor do instrumento promove a hemostasia. Quando ocorrer sangramento, usamos hemosthal ou uma gota de superbonder. Um procedimento prático é a utilização de instrumento para fazer gravuras me madeiras, o "pirógrafo". A extremidade metálica funciona como termocautério.
c) revisar periodicamente as patas dos pássaros, lavando com pinho sol ou outro desinfetante.
d) Poleiros. Pensamos que aí está o principal ponto de contaminação das unhas. Devem ser limpos a cada 2 a 3 semanas. Os poleiros de plástico são bem mais práticos para limpeza, além de não reterem tanta umidade.
e) Grades. Local onde o canário mais coloca as patas depois dos poleiros. Devem ser trocadas pelo menos 1 vez por semana. As grades sujas são imersas por 24 a 48 horas em água com detergente, para amolecimento das fezes, e limpas com escovas ou máquina de jato d'água sob pressão. Feito isto, devem ser novamente imersas em água com cloro, formol, iodóforos ou sais quaternários de amônia por mais 24 horas e, secas ao sol.
f) Alimentação de boa qualidade.
Por último, quando o problema é muito importante, podem-se usar preventivamente os antifúngicos orais por tempo prolongado para controlar a doença. É necessário que os criadores e clubes ornitológicos conscientizem-se da importância dos serviços profissionais de médicos veterinários. Embora existam poucos especialistas em pássaros ornamentais, é imprescindível o apoio destes para melhorarmos a saúde do nosso plantel, e só depende de nós, os principais interessados na saúde dos nossos passarinhos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Colabore Comentando!